O ‘Natal do Ibirapuera’ menciona patrocínio, mas não Jesus

Fui ao Parque do Ibirapuera ver a árvore de Natal. Às 19h30, as 210 mil lâmpadas foram acesas, e a árvore de 57 metros de altura brilhou contra o céu escuro do começo da noite paulistana. Desde o final da tarde, famílias inteiras esparramavam-se pelo gramado ralo. Algumas mais precavidas, estendiam toalhas para se sentar. Era difícil calcular quantas pessoas estavam lá, mas havia tanta gente que faltava espaço.

Sob o brilho da árvore roxa, pensei: isso é religioso ou cultural? A expansão do cristianismo pela Europa tratou de se adaptar ao costume ancestral de reverenciar árvores no solstício de inverno no hemisfério norte, a época mais escura do ano. É atribuído a São Bonifácio, missionário cristão do século VIII, o uso do pinheiro, cuja forma triangular representaria a Trindade. Dentre outros acréscimos cristãos, uma estrela foi colocada no topo para lembrar a estrela de Belém.

Nas últimas semanas, tivemos vários debates sobre as fronteiras entre o que é cultural e o que é religioso. Pode crucifixo em tribunais? Pode Caetano Veloso cantar música gospel num show? Pode Claudia Leitte trocar, na letra da música, “Iemanjá” por “Yeshua” (Jesus em aramaico)?

A árvore de Natal do Ibirapuera é roxa porque seu patrocinador é o Nubank. No chão, em letras brancas gigantes, está a marca “Nu”. Pode uma árvore de Natal ostentar propaganda de um banco?

O ‘Natal do Ibirapuera’ menciona patrocínio, mas não Jesus – 24/12/2024 – Cotidiano

Natal e comércio estão entrelaçados há muito tempo. Desde os ambulantes vendendo pipoca para as famílias no parque até as compras de presentes parceladas nos cartões de crédito, é fato que comércio e Natal estão tão unidos quanto quis o Concílio de Calcedônia (451) ao decretar a união entre a natureza humana e a divina de Jesus, conhecida na teologia como união hipostática.

Não tenho nada contra a propaganda do banco que patrocinou a montagem da árvore. Os juros cobrados dos clientes tornaram possível tal generosidade financeira. Também não penso que fosse necessário ter qualquer menção ao nome de Jesus na árvore, uma vez que ela é, em si, um símbolo associado ao seu nascimento. Mas, como cristão, tenho um questionamento.

Quando a Urbia, administradora do parque, e o Ministério da Cultura fazem a narração nos alto-falantes espalhados pelo bosque do “Natal do Ibirapuera” e não mencionam nada sobre o nascimento de Jesus, isso me parece uma grande trapaça histórica.

José não encontrou em Belém uma hospedaria que pudesse abrigar sua esposa Maria para dar à luz ao menino Jesus. Passaram-se dois milênios. Deixei o Parque do Ibirapuera com a sensação que mais uma vez a história natalina se repetia, pois não havia lugar para o menino Jesus nos gigantescos 1.584.000 metros quadrados na parte mais rica da São Paulo.

A árvore de Natal como símbolo cultural e religioso

A árvore do cristianismo é tão alta e com raízes tão profundas que não precisa de “mimimi” para sua defesa. O espetáculo natalino do Ibirapuera não deixaria de ser cultural para se tornar religioso se as narrativas bíblicas sobre o nascimento de Jesus fossem mencionadas. Seria, isso sim, mais rico culturalmente assumindo que Jesus e Natal são inseparáveis.

O antropólogo Claude Lévi-Strauss ensina que, entre outras coisas, as trocas de presentes marcam a passagem do estado de natureza (selvageria) para o estado de cultura. Defendo que precisamos de mais trocas e de mais generosidade nas permutas entre religião e cultura.

Que a cultura possa se apropriar de elementos religiosos, como a árvore de Natal, e que as religiões possam aparecer em espaços culturais sem que haja gente torcendo o nariz — como quando Caetano canta “Deus cuida de mim”, por exemplo. Todavia, que haja generosidade e respeito histórico às origens de cada símbolo religioso.

A reflexão sobre consumo e espiritualidade no Natal

O ‘Natal do Ibirapuera’ menciona patrocínio, mas não Jesus – 24/12/2024 – Cotidiano levanta um aspecto interessante sobre a relação entre o consumo e a espiritualidade durante a época natalina. A árvore de Natal, apesar de suas raízes religiosas, também representa um espetáculo de luzes e música que atrai cada vez mais o público geral, independente de suas crenças.

Essa dualidade, entre a comercialização do Natal e sua importância espiritual, reflete um fenômeno global em que festivais e celebrações religiosas são adaptados às tendências do mercado. A presença de marcas e patrocinadores nos eventos de Natal é, de certa forma, uma maneira de modernizar as tradições, mas também pode desvirtuar o seu significado original.

Quando observamos a árvore de Natal do Ibirapuera e sua cor roxa, notamos que a identidade visual utilizada foi cuidadosamente escolhida para trazer uma nova estética ao feriado. O que antes poderia estar imerso em símbolos cristãos, agora integra elementos contemporâneos de marketing. Isso pode gerar questionamentos: estamos nos afastando do verdadeiro significado do Natal ao focar na experiência de consumo?

O impacto das tradições na sociedade atual

O Natal é uma época que, além de gerar reflexões sobre a fé, nos convida a considerar questões como a solidariedade e a união. Mesmo com a presença do patrocínio, é possível redescobrir valores que vão além do comércio e que realmente tocam o coração das pessoas. O sentimento de fraternidade e acolhimento ainda pode ser encontrado no olhar de uma criança ao contemplar as luzes da árvore, ou ao ouvir uma canção natalina que resgata as recordações de momentos felizes.

É importante também notarmos que a tradição do Natal se reinventa a cada ano. A maneira como a sociedade se relaciona com a festividade está em constante evolução, e a maneira como celebramos pode sim ser entrelaçada com novas formas de expressão cultural. O desafio é encontrar um equilíbrio que respeite a essência espiritual da data, sem eliminar a possibilidade de celebrações mais contemporâneas e inclusivas.

Neste contexto do ‘Natal do Ibirapuera’, reconhecemos que o evento, mesmo com suas nuances comerciais, traz a oportunidade de transformar o período natalino em um momento de reflexão sobre o que realmente valorizamos.

Festival de luzes e a mensagem de esperança

A árvore de Natal do Parque do Ibirapuera não é apenas um símbolo de comércio. Sua beleza e a forma como ilumina as noites da cidade despertam o espírito festivo e a esperança em muitos corações. As luzes refletidas em cada lâmpada acesa podem ser vistas como pequenas estrelas que nos lembram da importância de encontrarmos luz em meio à escuridão.

Acima de tudo, o Natal é um momento de união, de celebração da vida e dos laços que construímos. Se as referências a Jesus não estão explícitas no evento, a essência da festa ainda reside nas alegrias simples como compartilhar um momento com a família, amigos e até mesmo estranhos. O ‘Natal do Ibirapuera’ pode ser uma vitrine para se discutir as contradições entre a celebração do Natal e seu patrocínio, mas também funciona como um espaço para resgatar o verdadeiro significado da festividade.

Perguntas frequentes

É a primeira vez que o Parque do Ibirapuera tem uma árvore patrocinada?

Sim, a árvore de Natal do Ibirapuera é patrocinada pelo Nubank, trazendo um novo enfoque para a tradição na cidade.

Qual a cor da árvore e por que foi escolhida?

A árvore é roxa, uma escolha estética que associa modernidade e festividade, além de ser uma decisão do patrocinador.

O que as pessoas pensam sobre a falta de menção a Jesus na árvore?

Há divergências de opinião; muitos consideram que a menção ao nascimento de Jesus deveria ser incluída, enquanto outros acreditam que o evento pode ser celebrado independentemente da religiosidade.

A árvore do Ibirapuera é alvo de debates sobre cultura e religião?

Sim, o ‘Natal do Ibirapuera’ suscita discussões sobre a intersecção entre religião e cultura e como essas duas esferas podem coexistir em um espaço público.

Como a árvore de Natal é recebida pela comunidade?

Em geral, a árvore de Natal é bem recebida, atraindo muitas famílias e turistas que buscam o espírito natalino e a magia da época.

O ‘Natal do Ibirapuera’ pode ser visto como um modelo para outros locais?

Certamente, a iniciativa pode servir de exemplo para outras cidades que buscam celebrar a festividade de maneira inclusiva e inovadora, equilibrando comércio e tradição.

Conclusão

O ‘Natal do Ibirapuera’ menciona patrocínio, mas não Jesus – 24/12/2024 – Cotidiano, propõe uma reflexão profunda sobre a dualidade da celebração do Natal em uma sociedade cada vez mais comercial. A árvore de Natal, enquanto símbolo cultural, carrega em sua essência a possibilidade de uma confluência onde comércio, tradição e espiritualidade podem coexistir de forma harmônica.

À medida que nos distanciamos das tradições pasteurizadas da vida moderna, surgem novos horizontes para entendermos a festividade. Que esse Natal, iluminado por luzes e cores vibrantes, nos lembre da importância de refugiarmos a espiritualidade e a generosidade em nossos corações, transformando cada encontro em um momento de esperança e união.

Em um mundo em constante mudança, continuar a defender a relevância cultural e espiritual do Natal é um desafio que todos devemos abraçar. Que, independentemente do que se menciona ou se omite, possamos celebrar sempre o que realmente importa: o amor, a família e a esperança de um mundo melhor.





Enviar pelo WhatsApp compartilhe no WhatsApp